“O apagão tem dois responsáveis. A Enel, que presta um serviço horrível, e Ricardo Nunes, que não faz nem o básico. Mais de 300 mil famílias não podem assistir a este debate porque estão sem luz em suas casas”, disse Boulos
Apagão, superfaturamento de contratos, máfia das creches, PCC e uma inusitada proposta de quebra de sigilo das contas pessoais que ficou sem resposta do adversário. O deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP), candidato à prefeitura de São Paulo com Marta Suplicy como vice, pautou esses temas, encurralou seu oponente, Ricardo Nunes (MDB), e venceu o debate da noite de segunda-feira (14), na Band.
“Teve um apagão de prefeito em São Paulo”, disse Boulos, logo no começo do debate, jogando Nunes para a defensiva na maior parte do tempo. “São Paulo tem que ter um prefeito forte. Você vem ao debate e tropeça, gagueja, imagina você em uma mesa com a Enel, não dá conta, Ricardo, você não segura”, disparou Boulos, que abordou, durante todo o debate, o pesadelo vivido pela população de São Paulo, sem energia há muitas horas, e assumiu o compromisso de atuar para retirar a concessão da empresa Enel.
“O apagão tem dois responsáveis. A Enel, que presta um serviço horrível, e Ricardo Nunes, que não faz nem o básico. Mais de 300 mil famílias não podem assistir a este debate porque estão sem luz em suas casas”, assinalou Boulos.
Nunes, por sua vez, esquivou-se de suas responsabilidades e chegou ao absurdo de terceirizar a culpa do apagão para o governo federal, ignorando que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é comandada por um aliado do próprio prefeito. “Quem é responsável por avaliar se vai romper ou não o contrato da Enel não é o governo federal, é a Aneel, cujo presidente foi indicado por Bolsonaro, e o presidente Lula não pode tirá-lo, porque ele tem mandato fixo”, rebateu Boulos.
Boulos atua mais por São Paulo
O apagão na capital paulista permeou todo o debate e o candidato do PSOL aproveitou para evidenciar vários aspectos da crise. Com menos de uma hora de duração, a chuva de sexta-feira “deixou mais gente sem luz em São Paulo do que na Flórida, onde ocorreu o furacão Milton”, comparou Boulos, que foi deputado federal mais votado de São Paulo. “Fiz mais do que você, que tem a caneta”, disse ele, ao lembrar da articulação no Congresso para a instauração da CPI da Enel, que não teve o apoio do MDB, partido de Nunes.
Sobre o apagão de 2023, Boulos lembrou que o prefeito estava no camarote da Fórmula 1 e foi também assistir ao UFC. ”Dessa vez, como está perto da eleição, resolveu colocar um colete para fingir que estava fazendo alguma coisa”, criticou.
Boulos responsabilizou Nunes por ter dobrado a população de São Paulo em situação de rua, questão que o deputado do PSOL se comprometeu a resolver, e convidou o candidato a reeleição a conhecer um empreendimento do Movimento dos Sem Teto, “que é muito melhor do que os poucos que você fez. Se você quiser, vamos lá amanhã”, propôs, ao detalhar que o movimento nunca invadiu a casa de ninguém e nem vai invadir.
“O que o movimento faz é dar casa para as pessoas”, destacou.
A candidata a vice, Marta Suplicy (PT), acompanhou Boulos nos estúdios e exaltou a performance de seu companheiro de chapa.
“Boulos dando show no #DebateBand, a escolha nunca esteve tão clara, vote 50”, postou ela em sua conta no Bluesky.
Quebra de sigilo
Logo no primeiro bloco, Boulos desafiou seu concorrente a quebrar o sigilo bancário e, como não obteve resposta, voltou ao tema mais duas vezes. Na última tentativa, destacou que “quem não deve, não teme”.
“Eu abro agora o meu sigilo bancário, a minha conta, você abre o seu! Te desafio para abrir! Você abre para a sociedade de São Paulo saber se você de fato é limpo como está dizendo que é! Já que você não tem nada a esconder, abre o seu sigilo, Ricardo, faça isso”, desafiou Boulos, diante de um reticente Nunes. Este trecho da fala do deputado, postado no perfil dele no Instagram, alcançou mais de um milhão de visualizações em menos de 12 horas após o fim do debate.
Boulos agradeceu os apoios de Tabata Amaral (PSB) e de José Luiz Datena (PSDB), “que se juntou a nós por entender o risco que a cidade está sofrendo por conta de situações em que a milícia se infiltra no poder público”, disse.
Corrupção e incompetência
Diante da tentativa de Nunes classificá-lo como extremista e radical, Boulos prontamente rebateu: “É porque querem que você tenha medo da mudança. Lembra que eles disseram a mesma coisa do Lula? Diziam que, se o Lula ganhasse, ia fechar igrejas e falavam de kit gay. Aconteceu alguma coisa disso? Nada!”, ironizou.
Nunes insistia no quesito experiência, e levou uma invertida. “Essa experiência sua, Ricardo, cheia de suspeita de corrupção, incompetência e que deixou essa cidade três anos abandonada, essa eu quero longe de mim. Pode guardar pra você, pra sua história, depois que você for ex-prefeito, a partir do ano que vem”, rechaçou.
Nunes tem vice suspeito
Boulos instigou o eleitorado a observar que a vida real em São Paulo é diferente da propaganda do oponente. “Ele fala, fala, fala de segurança, mas não respondeu se te aconselha a sair na rua tranquilo com o celular. Não respondeu porque sabe que não é possível”, apontou.
A população não se sente segura pelas ruas da cidade, disse Boulos, ao reafirmar que a Guarda Civil Metropolitana, em sua gestão, vai continuar armada, e questionou o vice de Nunes, Coronel Melo, que responde por homicídio.
Ainda sobre o vice, Boulos lembrou que ele defende que a polícia trate de forma diferenciada o morador da periferia e o do bairro dos Jardins. “Para ele, no Capão e na cidade Tiradentes, é chave de braço, e nos Jardins, é ‘bom dia, doutor’. Você concorda ou discorda do seu vice?”, indagou Boulos.
“Dêem um Google: ‘Ricardo Nunes’, mais ‘cunhado’, mais ‘PCC’”, pediu Boulos, aos telespectadores.
Ao ser questionado sobre aumento de impostos, Boulos foi taxativo. “Não vai ter porque não precisa, São Paulo tem dinheiro, tem o maior orçamento da história e o que falta é prefeito”, assinalou.
Contra a vacina
No primeiro turno, Nunes declarou que se arrependeu de ter sido a favor da obrigatoriedade da vacina. “Neste segundo turno você continua contra a vacina ou já mudou de posição de novo?”, questionou Boulos, que inquiriu também sobre se Bolsonaro fez tudo certo na gestão da pandemia. Outro questionamento sem resposta foi sobre a fila do câncer na cidade de São Paulo.
“E você, por politicagem, negou ceder o terreno para o Hospital do Câncer, que seria construído com dinheiro do governo Lula”, salientou.
Boulos falou de seu orgulho de ter Marta como vice. A ex-prefeita criou programas como o Céus e o Bilhete Único. “Foi uma grande prefeita. Nós vamos fazer o melhor governo da história de São Paulo”, anunciou.
Superfaturamento e ponto para motoboys
Boulos dedicou espaço para garantir que, a partir de 1º de janeiro, vai criar, pela cidade, 96 estruturas de apoio para os motoboys e taxistas. “Pode anotar isso que estou falando e me cobrar depois”, salientou. “Você poderá trabalhar todos os dias na cidade de São Paulo, vou liberar do rodízio. E para você que é taxista, vamos garantir a transferência de alvará e liberar a publicidade nos táxis para você ganhar um a mais no final do mês”, ressaltou Boulos.
Ao voltar para casa depois do debate, Boulos postou a “SP da vida real”, escreveu ele na rede BlueSky, junto com vídeo feito na porta da sua casa mostrando as ruas ainda sem luz.
“No debate fala bonito, foge da responsabilidade, mas a vida real é essa aqui. A gente ainda tá sofrendo com essa realidade”, disse ele.
Repercussões
“Guilherme Boulos, atrás nas pesquisas, foi para cima de Ricardo Nunes e conseguiu impor uma vitória, ainda que longe do nocaute. Ele pautou a falta de poda das árvores pela prefeitura como uma das causas do apagão ao lado da incompetência da Enel e bateu no suposto enriquecimento ilícito do adversário, desafiando-o a abrir o seu sigilo bancário. O prefeito passou recibo ao não topar”, sintetizou o site Uol, que trouxe análises dos jornalistas Raquel Landim e Thales Faria.
Landim destacou a performance do candidato do PSOL. “Guilherme Boulos é desenvolto, hábil com as palavras, explorava bem o palco, olhava para a câmera, conversava direto com o telespectador e fez perguntas muito objetivas sobre a situação de vida do paulistano”.
“O candidato do PSOL, deputado Guilherme Boulos, manteve o adversário do MDB, o prefeito Ricardo Nunes, nas cordas durante praticamente todo o debate”, postou o jornalista Thales Faria, ao detalhar que Boulos adotou a tática de repetir com firmeza as perguntas que Nunes evitava responder.
“Até utilizando expressão corporal, o deputado conseguiu sublinhar com firmeza o hábito do prefeito de fugir dos temas mais delicados. O ponto mais marcante desse embate foi quando o deputado insistiu em cobrar um pacto de quebra do sigilo bancário de ambos. Nunes desconversou seguidamente sem responder nem que sim, nem que não”,
Foto: Renato Pizzutto/Band