O Censo 2022 realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) revela aumento dos “desigrejados” no Brasil. O termo, cunhado pelo cardeal que preside a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Conselho Episcopal Latino-Americano e Caribenho (CELAM), designa quem, ao responder ao Censo, não se identifica como pertencente a alguma religião institucionalizada.
Dom Jaime tomou conhecimento dos números em uma reunião com representantes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelo Censo, durante o curso para os bispos realizado no Rio de Janeiro (RJ), em janeiro.
O IBGE diz que os dados consolidados oficiais sobre o perfil religioso da população brasileira devem ser apresentados até o início do segundo semestre. Segundo dom Jaime, o Censo revela uma estabilização da porcentagem de católicos no Brasil. Eles eram cerca de 90% da população até os anos 1960. Hoje, representam em torno de 50%.
População não confia no Congresso Nacional, igrejas evangélicas e Forças Armadas
Já a pesquisa AtlasIntel, realizada entre os dias 27 a 28 de fevereiro que avaliou a confiança da população em relação às instituições, mostrou aumento da desconfiança em relação às igrejas evangélicas. De de acordo com o levantamento, 73% dos entrevistados afirmam que não confiam nas igrejas evangélicas, 18% responderam que confiam e 9% não opinaram.
Em relação a igreja católica, 43% disseram que confiam, 34%, que não confiam e 24% não souberam responder.
A Polícia Federal é a instituição com mais alto índice de confiança dos brasileiros: 53%, seguido pela Polícia Militar (50%), Supremo Tribunal Federal (49%) e Polícia Civil (48%). O Congresso Nacional (9%), as igrejas evangélicas (18%), prefeituras (24%), Forças Armadas (24%) e o Banco Central (26%) registraram os piores índices de confiança. O Governo federal registra 42% de confiança, e os governos estaduais, 32%.
Dom Jaime Spengler | Jaison Alves/CNBB Sul 4
“Se num passado mais ou menos distante era comum por tradição se declarar católico, mesmo participando de espaços de outras expressões religiosas, hoje há uma maior transparência neste âmbito”, disse. “Hoje as pessoas não se sentem, talvez, constrangidas em se declarar pertencentes a outra tradição religiosa. Urge propor uma espiritualidade vigorosa a fim de promover o testemunho, a unidade de fé, a comunhão do Povo de Deus, encorajando um diálogo construtivo com todas as pessoas de boa vontade para fortalecer a missão dos batizados: ser sal da terra, luz do mundo, fermento de transformação, tendo como fundamento o Evangelho”, disse Dom Jaime Spengler, em entrevista ao ACdigital, site especializado em notícias da igreja católica.
Sem religião não significa sem fé
Além dos dados do do IBGE, uma pesquisa do Datafolha, realizada nas eleições de 2022, também mostrou o crescimento daqueles que se dizem sem religião no Brasil. No Censo de 2010, o grupo correspondia a 8% da população. Já nas primeiras pesquisas Datafolha de 2022, esse quantitativo subiu para 14%. Entre os jovens de 16 a 24 anos, o número dos sem religião chega a 25% em âmbito nacional.
Não ter religião não é o mesmo que não ter fé. Ainda de acordo com o IBGE, se autodeclarar como “sem religião” não está diretamente relacionado à descrença em Deus, o que torna o fenômeno ainda mais complexo. O último Censo revelou que, dos 15,3 milhões de brasileiros que se diziam sem religião, em 2010, apenas 4% (615 mil) se consideravam ateus, ou seja, não acreditavam na existência de Deus; e somente 0,8% se afirmavam agnósticos (124 mil), dizendo não ser possível afirmar com certeza se Deus existe ou não.
Em entrevista ao jornal O Liberal, de Belém (PA), o bacharel e mestre em Teologia, Ulicélio Valente de Oliveira, explicou que essas pessoas representam o que os estudos têm chamado de “desigrejados”: “São pessoas que cresceram dentro da igreja, mas, ao longo do tempo, por uma série de razões relacionadas a experiências negativas com a igreja, acabaram se afastando da institucionalização. Na visão deles, a instituição é falha e injusta e, muitas vezes, não representa o ser de Deus”.Ulicélio destaca abusos de poder, experiências de julgamento e, algumas vezes, falta de respostas satisfatórias a questionamentos essenciais para os jovens como algumas das causas mais comuns do afastamento deles com relação à religião. Além disso, o teólogo explica que a cultura contemporânea, fundamentada no racionalismo do século XIX, tende a questionar o mundo do ponto de vista da razão, indo de encontro a aspectos essenciais da religiosidade, como a fé: “A ciência acaba provando algo de forma palpável e racional enquanto a religião diz que algo é questão de fé. Então, para muitos jovens, a ciência acaba sendo a sua religião”.